Capítulo 2:
As aulas de fato começaram na semana seguinte e percebi que gostava muito de ir à faculdade. Sentava-me na verdade no meio da sala, não pertencendo nem ao grupo dos bagunçadores, os que ficavam na parte de trás, nem dos CDFs, que ficavam nas primeiras carteiras. Era médio em tudo. Não era bom em nada, mas também não era ruim em nada. Eu era médio.
Solange, o nome de minha paixão até então totalmente platônica, sentava-se a duas carteiras lateralmente de mim, à minha esquerda. Eu vivia com um olho na aula e outro nela. Vestia-se na moda da época, roupas coloridas, muito verde limão, amarelo ruidoso e vermelho queimado. Sempre com seus cabelos castanhos longos a combinar totalmente com aquele par de olhos vívidos e sensuais. Nisto estava fora de moda: na época a maioria das meninas da classe cortava os cabelos curtos, na moda New Wave.
No restante da classe, gordinhos, magrinhos como eu, gostosões, gostosinhas e muitas orientais, a maioria com o nome de Márcia. Acredito que naqueles anos de 1980 o costume entre os nipônicos era colocar o nome em suas lindas filhas de Márcia, com seus cabelos lisos e olhos negros misteriosos.
Logo um rapaz começou a se destacar entre a nossa turma. Parece que sempre deve existir alguém assim em qualquer comunidade. Seu nome era Valério, logo apelidade de O Terrível. Não apenas por ser o terrível com as mulheres, mas porque sabia tudo, e ninguém o via estudar. Devia ter um Q.I. muito alto. E o pilantra ainda era rico. Então acho que não é novidade que as garotas da classe orbitavam em torno dele. Menos Solange.
Ah, mas Solange conversava com ele, conversava com todos. Ela era expansiva, alegre, bem humorada e... Quando me deu um olá a primeira vez eu nem sequer consegui responder, perdi a voz. E, creio, não preciso dizer que meu coração disparou.
Mas voltando à nossa turma havia o Antunes. Ele tocava violão com maestria e logo, depois das aulas, sempre havia um showzinho onde ele cantava as de sempre, Te Amo Espanhola, Yolanda, ou Um Dia Frio...
Ficávamos ao redor dele, no chão mesmo ou no assento de concreto que torneava os canteiros, quase sem plantas, do andar de baixo de nosso prédio na faculdade. Eu tentava ficar perto de Solange, que cantava junto baixinho com uma voz doce, suave, mas não era páreo para o Antônio, o Pedro ou o próprio Valério, maiores e menos tímidos do que eu.
Mas eu sonhava. Sonhava muito com ela. Voltando para casa de ônibus sozinho - naquele começo de semestre eu ainda não fizera amigos – encostava a cabeça na janela (já devidamente tosquiada) e sonhava passeando pelo shopping com ela de mãos dadas e depois indo à sua república – eu já descobrira que ela morava em uma república com mais duas amigas – e a beijando e beijando, porque até então eu ainda só pensava em beijá-la, ingênuo que era.
Os dias pareciam passar cada vez mais depressa. Eu vinha de Salto, uma cidade também do interior do Estado de São Paulo, e meus pais que lá moravam resolveram que era melhor eu não ficar viajando todo dia. Agradeço à Deus por isso... Porque iriam procurar uma república em Campinas para mim, para ficar a semana toda em Campinas e só voltar à Salto de fim-de-semana... Bom, minha família era de classe média média e com um pouco de dor podia pagar um terço de aluguel de quitinete.
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